domingo, julho 31, 2005

Amor de Alma



Se fosses luz serias a mais bela
De quantas há no mundo: - a luz do dia!
- Bendito seja o teu sorriso
Que desata a inspiração
Da minha fantasia!
Se fosses flor serias o perfume
Concentrado e divino que perturba
O sentir de quem nasce para amar!
- Se desejo o teu corpo é porque tenho dentro de mim
A sede e a vibração de te beijar!
Se fosses água - música da terra,
Serias água pura e sempre calma!
- Mas de tudo que possas ser na vida,
Só quero, meu amor, que sejas alma!

António Botto

quarta-feira, julho 27, 2005

Heaven Sends You



(mood: Mission UK, "Heaven Sends You")

Como a palmeira jovem
que Ulisses viu em Delos, assim

esbelto era o dia
em que te encontrei;

assim esbelta era a noite
em que te despi,

e como um potro na planície nua
em ti entrei.

Eugénio de Andrade

terça-feira, julho 26, 2005

És tu a Primavera que eu esperava



És tu a Primavera que eu esperava,
A vida multiplicada e brilhante,
Em que é pleno e perfeito cada instante!

Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, julho 24, 2005

Só um homem e uma mulher...



Esta agitação... esta calma
de te querer amor de pele,
de carne, amor de alma
De te querer simplesmente
em desvario de palavra
de te sentir ardente
ardendo
entrar em mim tão profundamente
neste ardor que me ocupa
sem pudor nem culpa
só um homem e uma mulher... o amor
a cada fracção de tempo
este crescente calor...
este, que é o meu e o teu
e que nunca ninguém conheceu
não assim... como nós

Joana Ramos Pereira

sábado, julho 23, 2005

No teu rosto



No teu rosto começa a madrugada.
Luz abrindo,
de rosa em rosa,
transparente e molhada.
Melodia
distante mas segura;
irrompendo da terra,
quente, redonda, madura.
Mar imenso,
praia deserta, horizontal e calma.
Sabor agreste.
Rosto da minha alma.

Eugénio de Andrade

domingo, julho 17, 2005

Despertar



É um pássaro, é uma rosa,
é o mar que me acorda?
Pássaro ou rosa ou mar,
tudo é ardor, tudo é amor.
Acordar é ser rosa na rosa
canto na ave, água no mar.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, julho 15, 2005

O Sorriso



Creio que foi o sorriso,
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.

Eugénio de Andrade

Quando AMAMOS



Quando AMAMOS
não temos necessidade nenhuma de entender o que acontece,
porque tudo passa a acontecer DENTRO DE NÓS.

Paulo Coelho, "O Alquimista"

quinta-feira, julho 14, 2005

Se é para ti



Se é para ti,
sou o ovo de cotovia à beira do caminho.
Se é para outro qualquer,
sou o pequeno pássaro que dorme numa ilha longínqua.

Autor desconhecido (Madagáscar)
Versão: Herberto Helder

terça-feira, julho 12, 2005

Nuvem de acácia



Nuvem de acácia
alva e púrpura
de ternura

tão tua
e tão nua.

Um só corpo de água
o teu sobre o meu,
como um céu.

Diogo M Silva

domingo, julho 10, 2005

O Lume



Vai caminhando desamarrado
Dos nós e laços que o mundo faz
Vai abraçando desenleado
De outros abraços que a vida dá

Vai-te encontrando na água e no lume
Na terra quente até perder
O medo, o medo levanta muros
E ergue bandeiras pra nos deter

Não percas tempo,
O tempo corre
Só quando dói é devagar
E dá-te ao vento
Como um veleiro
Solto no mais alto mar

Liberta o grito que trazes dentro
E a coragem e o amor
Mesmo que seja só um momento
Mesmo que traga alguma dor
Só isso faz brilhar o lume
Que hás-de levar até ao fim
E esse lume já ninguém pode
Nunca apagar dentro de ti

Não percas tempo
O tempo corre
Só quando dói é devagar
E dá-te ao vento
Como um veleiro
Solto no mais alto mar

Mafalda Veiga

sábado, julho 09, 2005

Dons do Amante



Sobre a tua cabeleira hei-de pôr, para as núpcias,
uma coroa de borboletas com suas
asas pintadas.

Terás de volta ao pescoço flores de abóbora,
em prata,
e a lua que para ti noites e noites forjei.

Andarás pelo povo sobre um cavalo em turquesa.
Um cavalo ardente e leve, animado
pelo meu fogo de amor.

E a teus pés eu lançarei uma pedra quente quente:
o coração onde correm
milhões de gotas de sangue.

Poema Índio (América do Norte)
versão: Herberto Helder

sexta-feira, julho 08, 2005

Para que se justifique a nossa vida

(...)
Para que se justifique a nossa vida
É preciso que alguém a invente em nós.
Os que nunca inspiraram um poema
São as únicas pessoas sós.

Natália Correia

sábado, julho 02, 2005

Gosto de...


...
Há uns anos atrás li um texto, do Eduardo Prado Coelho, no DN, escrito em torno do "Gosto" e "Não Gosto". Nunca mais o esqueci. Hoje, depois de ler o post da Rita, "Afinidades", em http://intimidadeindecente.blogspot.com,
fiquei com vontade de partilhar alguns dos "Gostos", em que me revi, e juntar-lhes outros só meus. O resultado aqui está:
...
Gosto de gostar. Gosto dos focinhos húmidos dos animais e daquela forma de olhar como se alguém estivesse a olhar através do olhar deles. Gosto de sorrir e do meu sorriso. Gosto de brincar com pessoas que gostam de brincar. Gosto dos meus olhos. Gosto de estar apaixonado. Gosto de dizer "tu" como se "tu" pudesse(s) ser Deus. Gosto de pastéis de nata. Gosto de Jazz e de música popular brasileira. Gosto da palavra ternura. Gosto do azul do céu. Gosto de nuvens brancas. Gosto de ajudar. Gosto de filmes que acabam bem. Gosto de sorrisos cheios de sol. Gosto da minha casa. Gosto do jardim com as rosas, as buganvílias, a tabela de basket, o jacarandá, a magnólia e os amores-perfeitos. Gosto de livros, de lhes tocar e de os ler sem parar. Gosto dos momentos em que alguém desfaz o nó onde se protege. Gosto das minhas mãos e do que elas sentem e transmitem. Gosto de proteger o sono do outro. Gosto dos cabelos das mulheres e dos dedos que os percorrem. Gosto de ouvir quem tem algo para me dizer. Gosto da praia do Gigi naqueles fins de tarde preguiçosos. Gosto de olhares ternos. Gosto de dar a mão. Gosto da minha colecção da Burago de carros antigos. Gosto de nadar nu, no mar. Gosto de ti! Gosto de mim! Gosto de História. Gosto de conduzir. Gosto de conversar. Gosto de tornozelos elegantes. Gosto do silêncio das catedrais. Gosto dos sítios que ainda quero visitar, Siena, Veneza, Florença, o pulo do lobo, e outros que não sei de cor. Gosto de relógios. Gosto de dizer o que sinto. Gosto de chocolate, sólido ou quente. Gosto que me façam carinhos. Gosto ainda mais de os fazer. Gosto de cães. Gosto da sedução que se intensifica através das palavras. Gosto de Paris. Gosto de oferecer as rosas do meu jardim, porque foram cuidadas por mim e têm mesmo perfume de rosa. Gosto da National Gallery e dos jardins de Londres. Gosto da liberdade. Gosto do Bairro Gótico em Barcelona. Gosto de Lisboa vista da ponte. Gosto de adormecer em paz. Gosto de olhar no fundo dos olhos. Gosto de dar aulas e dos meus alunos. Gosto de olhar o mar, sobretudo ao pôr-do-sol, com uma mão na minha. Ou mesmo sozinho, quando é preciso pensar. Gosto de beijar. Gosto de roupas confortáveis. Gosto de subir a Serra de Sintra de bicicleta. Gosto de futebol e do Benfica. Gosto de sentir os sons da Natureza e a sua paz. Gosto de rir. Gosto de sonhar. E há pessoas de quem gosto tanto que não posso dizer apenas que gosto delas. Por isso não falo delas aqui.
Gostei de falar de mim.

sexta-feira, julho 01, 2005

Prece



Que nenhuma estrela queime o teu perfil
Que nenhum deus se lembre do teu nome
Que nem o vento passe onde tu passas.

Para ti criarei um dia puro
Livre como o vento e repetido
Como o florir das ondas ordenadas.

Sophia de Mello Breyner Andresen