segunda-feira, abril 18, 2005

Poema



Podemos falar dos sentimentos,
descrever as impressões que nos ameaçam,
e revelar o vazio que se descobre
na ausência um do outro:
nada, porém, é tão inquietante como a dúvida,
o não saber de ti, ouvir o desânimo na tua voz,
agora que a tarde começa a descer e, com ela,
todas as sombras da alma.
É verdade que o amor não é apenas
um registo de memórias.
É no presente que temos de o encontrar:
aí, onde a tua imagem se tornou
mais real do que tu própria,
mesmo que nada te substitua.
Então, é porque as palavras são supérfluas;
mas como viver sem elas?
Como encontrar outra forma de te dizer
que o amor é esta coisa tão estranha,
dar o que nunca se poderá ter,
e ter o que está condenado a perder-se?
A não ser que guardemos dentro de nós,
num canto de um e outro
a que só nós chegamos,
sabendo que esse pouco que nos pertence
é tudo o que cabe neste sentimento.

Nuno Júdice

4 Comments:

Blogger Rita C. said...

Soneto

Lábios
que encontram outros lábios
num meio de caminho, como peregrinos
interrompendo a devoção, nem pobres
nem sábios numa embriaguez sem vinho:

que silêncio os entontece quando
de súbito se tocam e, cegos ainda,
procuram a saída que o olhar esquece
num murmúrio de vagos segredos?

É de tarde, na melancolia turva
dos poentes, ouvindo um tocar de sinos
escorrer sob o azul dos céus quentes,
que essa imagem desce de agosto, ou
setembro, e se enrola sem desgosto
no chão obscuro desse amor que lembro.

Nuno Júdice

A tua sensibilidade, extraordinária, na selecção dos poemas que aqui colocas é magnífica.
Deixas-me sempre sem palavras..
Aqui fica este poema, também de Nuno Júdice, sem particular significado contextual, neste momento.
Apenas porque gosto dele.
E gosto de ti. Muito.
Beijo doce e (e)terno, já sabes..

18 abril, 2005 23:07  
Anonymous Anónimo said...

Um texto lindíssimo.Talvez porque fale de modo único do timing e da durabilidade (ou não) do amor em função da sua presença/ausência.
..ou talvez porque me faça tanto sentido nesta fase da minha vida.
Seja porque for gostei muito. Já te disse hoje que gosto muito das selecções de autores que fazes? he he he :)
mais um Beijinho grande
mood

01 junho, 2005 02:12  
Anonymous Anónimo said...

"Desculpa mas n há palvras que xeguem para comentar"
É lindo demais...
Um beijo...

06 junho, 2005 12:19  
Blogger Richie said...

Realmente... um texto belíssimo. E sinto também muita dificuldade em comentá-lo... abordar a quase inevitabilidade da fragilidade do amor.

Mas apetece-me destacar o final, absolutamente extraordinário:

"Como encontrar outra forma de te dizer
que o amor é esta coisa tão estranha,
dar o que nunca se poderá ter,
e ter o que está condenado a perder-se?
A não ser que guardemos dentro de nós,
num canto de um e outro
a que só nós chegamos,
sabendo que esse pouco que nos pertence
é tudo o que cabe neste sentimento."

A única coisa que desejo, neste contexto, é ter a felicidade de deixar sempre algo de bom... no coração das pessoas com quem me cruzo nesta vida. Sobretudo das que considero especiais.
E delas reter sempre o melhor... esquecendo esta ou aquela mágoa. Afinal, acredito que todos fazemos e damos sempre o melhor de nós, na medida das nossas possibilidades e dos contextos que envolvem as nossas vidas.

Um beijo grande e muito obrigado pelos vossos comentários.

06 junho, 2005 15:10  

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