quarta-feira, abril 06, 2005

Página do diário de um aluno

Reprovei. “És um malandro!” – disse o meu Pai. “Não dás para os estudos” – disse a minha Mãe. E eu não sou malandro, nem burro! Ou serei? Realmente eu não estudo muito e não entendo lá muito bem certas coisas que os professores dizem. Mas o meu pai até gosta que eu vá para o campo com ele. Ainda ontem carreguei sacos para o tractor durante toda a manhã. Começamos ainda o sol mal tinha nascido e só parámos quando ao meio-dia a Mãe nos chamou para o caldo. E trabalhei de boa vontade. O meu pai disse que eu ajudava mais do que um homem... Então serei malandro? A verdade é que gosto mais de trabalhar no campo do que estar na escola. Não vejo para que servem muitas das coisas que lá se estudam. E depois... os professores não ajudam! No princípio eu julgava que ia conseguir e até ia com vontade. Mas comecei logo a desanimar. Foi lá uma senhora à sala e disse que aquilo ia ser difícil, que muita gente ia reprovar. Só quem trabalhasse muito e tivesse boa cabeça é que conseguia. E ela tinha razão. Comecei a não entender as coisas – os professores falam de uma maneira tão difícil! Eu tinha vergonha de perguntar, porque me parecia que só eu é que não entendia. E para além disso, alguns colegas faziam tudo tão depressa! Mas eu, e muitos da minha turma, mal tínhamos começado e já os professores estavam a querer tudo feito. E é aos que fazem bem os trabalhos que os professores ligam mais. Gostam mais deles e é natural. São mais inteligentes, trazem sempre os trabalhos feitos como os professores querem. Estão sempre prontos a responder, levam todo o material que eles pedem. Mas escusavam de nos desencorajar tanto, a nós que não temos tanta cabeça. Falam do que fazemos e de sermos vagarosos, de um modo tão zangado!
Na Páscoa tivemos uma aula de Ciências em que viemos apanhar bichos e os levámos para a sala. Eu lembrei-me de construir umas gaiolas para os grilos e umas caixas para as sardaniscas e as cobras de água que apanhámos. Depois até contei sobre esses bichos algumas coisas que eu tenho visto e eu sei. Trabalhei com vontade dessa vez. Se fosse sempre assim! O professor até disse “para a brincadeira estás sempre pronto...”
Acabou-se. Agora já não há remédio. Certamente para o ano já não posso voltar para a escola. Mas também não sei se me apeteceria. De alguns colegas gosto. Gosto dos recreios, gosto de vir com eles para a rua. E gostava de gostar da escola e dos professores. Mas nunca tive nenhum que gostasse de mim. Porque será?

Começou agora mais um período lectivo. Este post é para mim! E para todos os que têm responsabilidades na área da educação ou por ela se interessam.
Para que nunca nos esqueçamos do mais importante:
Eles! E sobretudo, estes eles!